A MAÇONARIA E A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL – UMA SÍNTESE
Inicialmente, gostaríamos de esclarecer que, quando falamos nos feitos da Maçonaria, queremos dizer sobre os Maçons que agiram de forma organizada, mas muita das vezes, de maneira isolada.
Alguns autores entendem que, a história de nossa independência política começou com a vinda da família real portuguesa para o Brasil. Entretanto, para outros historiadores maçons, esse processo teria começado muito antes, ou seja, já em 1724, com a fundação da Academia Brasílica dos Esquecidos.
Podemos dizer que, a Independência do Brasil foi sendo construída ao longo de um século, sob fortes influências maçônicas, a qual foi, paulatinamente, ganhando força. Começara, mesmo que timidamente, com a primeira organização ou associação, que escondia em sua essência o ideal de libertação do Brasil de Portugal.
Inicialmente, foram criadas associações revestidas de serem literárias ou beneficentes. Contudo, sua finalidade precípua era pautada no ideal libertário, de apartar o Brasil de Portugal, ainda que essas ações fossem pouco percebidas nesse momento.
Nesse intuito, várias organizações foram fundadas sob o nome de “Academia”, “Sociedade”, “Clube” etc., porém, no fundo, o propósito era de libertar o Brasil do jugo de Portugal.
Assim, segundo o grande historiador Kurt Prober, a primeira Sociedade Secreta da qual se teve notícias foi a Academia Brasílica dos Esquecidos, fundada em 7 de março de 1724, em Salvador, Bahia, pelo Padre Gonsalo Soares de França.
Seguida a ela, destacamos a Academia dos Felizes que foi fundada em 1736, no Rio de Janeiro, cidade em que, no ano de 1752, tivemos a fundação da Academia dos Seletos ou Associação Literária dos Seletos.
A Academia dos Renascidos também conhecida como Academia Científica, foi fundada em 19 de maio de 1759, na Bahia. O objetivo inicial desta Associação era escrever a história da América portuguesa.
Também destacamos a fundação da Sociedade Literária do Rio de Janeiro, fundada em 1786 e, neste mesmo ano, o Clube dos Inconfidentes fundado, em Ouro Preto, à época, José Alvares Maciel era um dos seus principais líderes.
Destacamos ainda a fundação do Areópago de Itambé, em Pernambuco, no ano de 1796. E, no ano seguinte, em 1797, a fundação da “Loja” Cavaleiros da Luz, na povoação da Barra, na Bahia, ensejando a Conjuração dos Alfaiates ocorrida em 1798, neste Estado e a qual teve participação e liderança de Maçons.
Em 1800 tivemos a criação da Loja Maçônica União, em Niterói, a qual foi instalada em 1801 com o nome de Loja Reunião.
Em 1802, foi fundada na Bahia, a Loja Virtude e Razão. Posteriormente, as Lojas Constância, Filantropia e Emancipação, fundadas em 1804. Contudo, em 21 de agosto de 1806 ocorreu a suspenção dos trabalhos maçônicos dessas Lojas.
Ressaltamos que, no início, em 1813, tivemos o surgimento de um Grande Oriente Brasileiro, uma Obediência considerada efêmera e sem suporte legal, cujo Grão-Mestre fora o Irmão Antônio Carlos Ribeiro de Andrade Machado e Silva.
Embora tivéssemos a fundação dessa Obediência, somente dois anos após o seu surgimento é que teríamos, de fato, o começo do que se tornou hoje o Grande Oriente do Brasil.
Nesse sentido, lembramos que, em 15 de Novembro de 1815, foi fundada a Loja Comércio e Artes, considerada a Primaz do Brasil e que, inicialmente, ficou subordinada ao Grande Oriente Lusitano. Sua fundação visava fortalecer o processo que se iniciara na direção da Independência do Brasil.
Todavia, apesar da referida Loja ter sido criada com o objetivo de concretizar a Independência, segundo alguns autores, D. João VI a teria proclamado, em dia 16 de dezembro de 1815, elevando-o a categoria de “Reino Unido de Portugal e Algarves”.
Vale ressaltar que, com o Alvará de 30 de março de 1818, em que o Príncipe Regente D. João proibia a existência de quaisquer sociedades secretas em Portugal e em todos os seus domínios, a Loja Comércio e Artes acabou por suspender seus trabalhos.
Em 26 de abril de 1821, D. João ao partir para Portugal se despediu de D. Pedro, Príncipe Regente, aconselhando-o: “Pedro, se o Brasil se separa, antes seja para ti, que me hás de respeitar, do que para algum desses aventureiros”.
A esse respeito, a história registra que, antes do “Grito do Ipiranga” e nos momentos mais difíceis, D. Pedro recorria a seu pai, D. João VI, escrevendo-lhe cartas, narrando os acontecimentos de forma leal e respeitosa, assim, podemos citar uma sequência delas: 04/10/1821; 11/12/1821; 30/12/1821; 02/01/1822; 09/01/1822; 23/01/1822; 16/02/1822; 14/03/1822; 28/04/1822; 21/05/1822; 11/06/1822; 19/06/1822; 22/06/1822.
Dessa forma, podemos dizer que, o que ocorria no cenário político do Brasil repercutia diretamente na maçonaria. Sendo assim, somente após o retorno de D. João VI para Portugal, em 24 de junho de 1821 é que ocorreu a reinstalação da Loja Comércio e Artes com o título distintivo de Loja Comércio e Artes na Idade do Ouro, com o principal objetivo, como já citamos, de conquistar a emancipação política do Brasil.
Portanto, a Loja Comércio e Artes retomou seus trabalhos com toda força e vigor, passando a agregar um grande número de obreiros. Por isso, no início do ano de 1822, ficou acertado seu desdobramento em mais duas, com vistas a criação de uma Obediência Maçônica que congregasse e representasse todos os maçons do Brasil, perfazendo um total de três Lojas, a saber:
A Loja Comércio e Artes que simboliza a idade do Ouro.
A Loja União e Tranquilidade simbolizando as palavras de D. Pedro, na varanda do paço, em 9 de janeiro de 1822. Nesse sentido, Kurt Prober afirma que, na eleição para a escolha do nome distintivo da Loja, havia também a opção do nome “Nove de Janeiro”, alusiva ao dia do Fico, não teve o apoio da maioria, prevalecendo, assim, União e Tranquilidade.
E, por última, a Loja Esperança de Nictheroy que simbolizava um projeto ambicioso, o qual visava a emancipação do então Reino português desse continente americano, ou seja, objetivava afastar deste continente o domínio de Portugal.
Assim surgia, em 17 de junho de 1822, o que viria a ser a maior potência maçônica da América Latina: o Grande Oriente do Brasil, fundado pela união dessas três Lojas Maçônicas regulares que então surgiam, a saber:
Vale lembrar que, o dia 09 de janeiro de 1822 ficou marcado em nossa História como o “Dia do Fico”. Isso pois, ao receber o documento que pedia sua permanência no Brasil, D. Pedro, orgulhosamente, declarou: “Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto: ‘diga ao povo que fico’.”
Poucos meses depois, aconselhado por José Bonifácio, D. Pedro assinou um decreto no qual estabelecia que, toda e qualquer ordem oriunda de Portugal só seria obedecida e executada após o “Cumpra-se” do Príncipe Regente.
É importante salientar que, em 13 de maio de 1822, D. Pedro recebeu o título, oferecido pelos maçons, de DEFENSOR PERPÉTUO DO BRASIL, para tanto, fora promovida uma grande festa.
Como podemos observar, a Fundação do Grande Oriente do Brasil e a proclamação da Independência são dois fatos históricos intimamente interligados, não só pela participação direta e efetiva de grandes Maçons, mas, dentre outras coisas, pelo próprio fato de que o ano da nossa Independência também registra o nascimento do Grande Oriente do Brasil, ocorrido em 17 de Junho de 1822.
No início de sua fundação, o Grande Oriente do Brasil possuía um sistema de governo semelhante ao de uma Grande Loja. Porém, após a Proclamação da República no Brasil, o GOB passou a funcionar, tal como hoje conhecemos, com um sistema federativo, tendo como um de seus idealizadores, o Conselheiro Macedo Soares que, tempos depois, veio a substituir o Marechal Deodoro da Fonseca como Grão-Mestre.
Destacamos que, D. Pedro foi iniciado em 02 de agosto de 1822 na Loja Comércio e Artes, segundo Kurt Prober. E, em 05 de agosto do mesmo ano, o Grande Oriente do Brasil, sob a direção de Gonçalves Ledo, autorizou a referida Loja promover Guatimozim ao grau de Mestre.
Em 22 de agosto de 1822 foi proposto o nome de D. Pedro para Grão-Mestre, no lugar de José Bonifácio.
Vale observar que, D. Pedro tomou posse como Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil em 04 de outubro de 1822 e presidiu as Sessões dos dias 05 e 11 de outubro. No dia 12, D. Pedro fora aclamado Imperador Constitucional do Brasil, sendo sua sagração e posse no dia 1º de dezembro de 1822.
Contudo, lembramos que, em 25 de outubro de 1822, os trabalhos maçônicos do Grande Oriente do Brasil foram suspensos por D. Pedro I.
Ressaltamos que, paralelamente a esses acontecimentos maçônicos, em 1º de setembro de 1822 foi articulada, por José Bonifácio, uma reunião sob a presidência da princesa Leopoldina. Nesta ocasião ficou entendido que era chegado o momento da separação do Brasil de Portugal.
Em razão desse importante acontecimento, tanto José Bonifácio quanto a princesa Leopoldina escreveram a D. Pedro, relatando-o os últimos acontecimentos, uma vez que o então Príncipe Regente estava em viagem à Província de São Paulo.
Lembramos que, devido a viagem de D. Pedro à Província de São Paulo, a Proclamação da Independência não ocorreu na capital do Império, ou seja, no Rio de Janeiro.
Nessa viagem, D. Pedro tinha, dentre outros, alguns próximos em sua companhia, como o Padre Belchior Pinheiro de Oliveira, sobrinho de José Bonifácio; e o Coronel Marcondes de Oliveira Melo, subcomandante da Guarda de honra e futuro Barão de Pindamonhangaba.
Tendo em vista a reunião ocorrida sob a presidência da Princesa Leopoldina, como citamos anteriormente, José Bonifácio enviou até D. Pedro, mensageiros portando três cartas e a eles instruiu, dizendo-lhes: “se não arrebentar uma dúzia de cavalos no caminho, nunca mais será correio. Veja o que faz!”. Uma dessas cartas era do próprio José Bonifácio, apoiando a separação do Brasil de Portugal.
As cartas foram lidas pelo Padre Belchior ao Príncipe, que as teria arrancado de suas mãos, amarrotando, pisando e deixando-as no chão, ao passo que o referido Padre pode resgatá-las. Em seguida, perguntou o Príncipe: “e agora Padre Belchior?”
Embora Pedro Américo retrate de forma esplendorosa o grito de “Independência ou Morte”, em sua tela intitulada o Grito do Ipiranga (Museu do Ipiranga – SP), na verdade, segundo um grande historiador, “o Príncipe-Regente proclamou a Independência do Brasil com trajes cobertos de lama e de poeira, parecendo mais um humilde tropeiro do que um futuro imperador”.
Segundo Laurentino Gomes, “o trono brasileiro nasceu representando os traficantes de escravos e os donos dos cativos”, ou seja, fazendeiros e senhores de engenho e pecuaristas. Todos eles exigiram em troca do apoio à Independência, que a escravidão não fosse abolida e assim foi feito.
Embora todos esses feitos sejam memoráveis e importantes para a Independência política do Brasil, em 08 de setembro, ou seja, o dia imediatamente após a declaração da Independência, a população não tinha nenhum motivo para festejar ou comemorar. Tudo permanecia igual e sem qualquer perspectiva de mudança, inclusive, a escravidão continuava firme e forte.
A verdade é que, o caminho da Independência já vinha sendo arquitetado, mesmo que lentamente, há quase um século antes de sua efetivação. A atuação dos maçons foi decisiva nesse processo, desde o surgimento das associações, como já dissemos.
Lembramos que, como afirma Laurentino Gomes, os principais defensores das alternativas republicanas, democráticas e federalistas pagaram um alto preço, como foi o caso de Joaquim Gonçalves Ledo, Cipriano Barata e Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, líder e mártir da Confederação do Equador. O primeiro foi afastado do cenário político, o segundo encarcerado por grande parte da vida e o último executado.
Portanto, quem quer que se opusesse a Dom Pedro era, de uma maneira ou outra, silenciado. Assim, vários Irmãos valorosos e que prestaram relevantes serviços a nação brasileira, foram perseguidos em razão de suas posições políticas.
A nossa Independência custou a liberdade de muitos, além de algumas vidas, sendo o caso de maior repercussão, dado sua popularidade, a de Frei Caneca, porém a mais emblemática foi a de Tiradentes, em 21 de abril de 1792.
Vale lembrar que, a Inconfidência Mineira, bem como a Independência do Brasil não tinham como finalidade melhorar as condições sociais da população pobre, muito menos acabar com a exploração interna. A princípio, ela visava apenas beneficiar a uma minoria, que concentrava a riqueza e terras.
Concluindo, com isso, podemos refletir sobre o fato de que, com a Independência política do Brasil não se alcançou, imediatamente, a liberdade, no sentido amplo da palavra.
Contudo, hoje, 195 anos depois, será que alcançamos a liberdade que implica segurança, direitos iguais e protegidos, igualdade de oportunidades para todos os iguais?
AILDO CAROLINO
Grão-Mestre Adjunto
Presidente do CEO